O vírus que neste momento assola a população mundial é invisível, mas suas consequências mais drásticas recaem sobre corpos que têm classe, raça e gênero bastante nítidos. As condições de habitação, de acesso à água potável e aos serviços de saneamento, de informalidade e precariedade do trabalho e de cuidados domésticos e familiares são parte da linha que separa, por um abismo, o modo como os ricos e os pobres no Brasil vão atravessar a pandemia.
Nos marcos dessa realidade, as medidas adotadas de combate ao novo coronavírus não impactam igualmente homens e mulheres. Quando crianças são liberadas das escolas e quando idosos necessitam de cuidados especiais, sabemos que essas responsabilidades recaem especialmente sobre as mulheres. Os cuidados adicionais com a higienização das vestimentas usadas na rua, roupas de cama, limpeza de utensílios de uso pessoal, higienização das compras e diversas outras obrigações são pesos nos ombros das mulheres na maioria dos lares.
São mulheres negras a maioria das terceirizadas em empresas, em especial as que cumprem função de limpeza. Por conta das orientações referentes à prevenção ao coronavírus, estas mulheres têm estado ainda mais sobrecarregadas em seus trabalhos e em muitos casos, sem direito à quarentena ou mesmo às condições mínimas de prevenção ao contágio.
Igualmente, muitas empregadas domésticas não estão sendo liberadas de seus serviços e estão sem acesso às medidas de prevenção adequadas. No Rio de Janeiro, o primeiro caso fatal de coronavírus foi de uma mulher de 63 anos que contraiu a doença de sua patroa, que acabara de voltar da Itália.
Em postos de trabalho precarizados, muitas mulheres, em sua maioria negras, seguem trabalhando nos serviços de telemarketing em ambientes fechados, com pouca ventilação e muito próximas umas das outras, contrariando todas as orientações internacionais. É necessário pressionar para que estas trabalhadoras e trabalhadores sejam protegidos.
Sabemos, também, que a informalidade é uma realidade avassaladora para as mulheres brasileiras. Milhares de diaristas, cabeleireiras, manicures, motoristas de aplicativo estão perdendo, neste período, a única fonte de renda que possuem.
Na linha de frente de combate ao coronavírus estão os profissionais de saúde, categoria composta majoritariamente por mulheres. Também somos maioria nos serviços que seguirão abertos em período de reclusão, como as trabalhadoras do transporte público, as operadoras de caixas de mercados e as atendentes de farmácia. Estas são mulheres fundamentais para enfrentar esta crise, mas também as mais expostas aos riscos da doença.
Muito embora a quarentena seja um direito necessário e deva ser garantido universalmente a todos os segmentos da classe trabalhadora, o âmbito doméstico é o espaço em que muitas mulheres seguem em insegurança e risco. A violência doméstica é uma realidade cruel no Brasil e no mundo. Na China, ONGs de proteção à mulher informaram que as denúncias de vítimas e de testemunhas de violência machista triplicaram desde o início da reclusão. No Brasil, alguns estados já vêm identificando este crescimento de notificações. O Rio de Janeiro, por exemplo, registrou aumento de 50% de casos neste período inicial de quarentena.
Também precisamos estar especialmente atentas à realidade dos povos originários. Historicamente, os povos indígenas sofreram com a dizimação a partir de epidemias levadas às aldeias. Com a atual pandemia do coronavírus se alastrando rapidamente, os povos indígenas, especialmente os grupos de contato recente, estão entre os mais vulneráveis. Por isso, é necessário pensar uma política específica para esse grupo de risco, como o fechamento de aldeias e reservas. As mulheres indígenas tomam a frente dos cuidados de seus povos, mas é preciso que haja assistência médica nas aldeias, prejudicada desde a saída dos médicos cubanos do Programa Mais Médicos.
Mais de 6 mil quilombos espalhados pelo país enfrentam a ausência de políticas públicas, em especial de saúde. A falta de informações e ações efetivas de combate ao coronavírus atingem de maneira brutal essa população, que é composta por 30% de mulheres e homens idosos.
Todas essas circunstâncias que ameaçam a vida das mulheres neste cenário de crise planetária apontam que o capitalismo encontra seu limite absoluto para a preservação das vidas humanas. É preciso que nós, lutadoras socialistas, denunciem que os donos deste sistema, os grandes proprietários e seus governantes, neste momento, dão preferência aos lucros em detrimento das vidas. Riscam o destino de milhões de pessoas ao redor do mundo na ponta do lápis com que fazem seus cálculos de perdas e ganhos financeiros.
No Brasil, a população não aguenta mais ser governada por um inconsequente como Jair Bolsonaro. Contrariando todas as orientações de autoridades internacionais e da comunidade científica, o presidente segue minimizando a crise social e de saúde na qual o país mergulha profundamente. Junto com sua equipe econômica, vem propondo medidas de ajuste fiscal, de corte de salários e ataque às trabalhadoras e trabalhadores que, em pouquíssimo tempo, não terão dinheiro para colocar comida na mesa de casa. Os panelaços diários em inúmeras cidades do país demonstram que não há mais condições de Bolsonaro continuar. Fora Bolsonaro!
Diante desse quadro, a Setorial de Mulheres do PSOL considera necessárias as seguintes medidas, campanhas e reivindicações para salvar a vida das mulheres:
Direito à quarentena para todas e todos! Exigir liberação imediata do trabalho sem redução ou suspensão da remuneração e com estabilidade de ao menos um ano após o fim da crise;
Revogação imediata da MP da Morte (MP 927) que suspende direitos fundamentais dos trabalhadores e suspende salários durante a crise;
Revogação da Emenda Constitucional 95, que limita o investimento nas áreas sociais, como na saúde, e resulta no sucateamento do serviço público;
O Estado deve oferecer condições mínimas de sobrevivência! Estender o Benefício de Prestação Continuada (BPC) para as mães chefes de família de baixa renda que estão em quarentena, ou em casa cuidando dos filhos; Aprovação do Projeto de Lei nº 698/2020, de autoria da bancada do PSOL, que cria o Programa de Renda Básica Emergencial prevendo pagamento mensal de um salário mínimo às famílias em condição de vulnerabilidade social, priorizando mulheres;
Proteção à vida das mulheres! Exigir que seja garantida a continuidade dos serviços essenciais para responder ao possível crescimento de casos de violência contra mulheres em período de reclusão: reforço nas equipes de atendimento do 180 e criação de novos postos de atendimento a mulheres em situação de violência;
Medidas anti-cárcere para salvar vidas! Suspensão das prisões provisórias, em especial de mulheres gestantes, priorizando as alocadas em estabelecimentos com superlotação e prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 dias, além de conceder direito à prisão domiciliar nos casos previstos por lei;
Fortalecer a atenção à saúde reprodutiva das mulheres! Exigir que sejam mantidos os serviços e cuidados com saúde sexual e reprodutiva, incluindo atenção ao pré-natal e pós-natal, bem como atenção aos casos de aborto legal; Garantir que os hospitais que trabalham de portas abertas e também realizam partos tenham separação no atendimento entre suspeitos de coronavírus e público geral, dando especial atenção às parturientes;
Proteção às trabalhadoras dos serviços essenciais! Exigir garantia de que as necessidades imediatas das mulheres que trabalham no setor da saúde e do transporte público sejam atendidas, como EPIs, materiais de higiene, entre outros;
Proteção para quem sempre cuidou! Dispensa remunerada das empregadas domésticas e diaristas pelos empregadores para que, assim, cumpram com as exigências de precaução no combate à propagação contagiosa do COVID-19;
Campanhas de conscientização da divisão dos trabalhos domésticos e com relação à legislação referente à violência contra mulheres e meninas;
Atenção especial com os povos originários! Aumento dos recursos para o fortalecimento da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e das Casa de Saúde Indígena (CASAI) durante esta pandemia e também posteriormente, para que os povos indígenas sejam melhor assistidos na rede pública de saúde; Fechamento das aldeias, para não permitir que o vírus seja levado das cidades para essas regiões.
Proteção às comunidades Quilombolas! Transparência na distribuição de produtos de higiene e cesta básicas a fim de garantir a segurança alimentar desta população; Garantia de leitos que atendem as comunidades quilombolas.
Fonte: https://psol50.org.br
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